Requisitos de Qualidade dispostos na
RDC nº 430/2020
Vários requisitos novos foram introduzidos na RDC nº
430/2020. Os atores da cadeia farmacêutica têm dado muita atenção aos artigos
64 e 43, que tratam do controle e monitoramento de temperatura, mas pouca
atenção tem sido destinada a um tópico muito importante, que é a Gestão da Qualidade.
Neste
artigo vou abordar o Capítulo III, Seção III - Sistema
de Gestão da Qualidade.
O medicamento produzido e
controlado pela fábrica deve ser mantido nas condições especificadas na
rotulagem durante todo o seu trajeto pela cadeia de distribuição, chegando até
o paciente em condições adequadas de uso.
É importante que a cadeia toda
tenha o entendimento de que a manutenção da qualidade do medicamento é
responsabilidade de todos os elos, devendo as empresas mapearem os processos que
impactam na qualidade dos medicamentos e serviços. Todos os processos identificados
devem ser gerenciados por POPs - procedimentos operacionais padrão. Como em
qualquer processo, registros devem ser gerados, mantidos e distribuídos às áreas
de interesse.
As atividades do Sistema de
Gestão da Qualidade são de responsabilidade de toda a empresa e devem ser
exercidas por todos os seus membros, desde a alta direção até o mais simples
dos subordinados. A qualidade não é responsabilidade exclusiva da área da
Qualidade e seus prepostos! Neste sentido, a alta direção deve dar um nível adequado
de autonomia para a equipe responsável pelo Sistema de Gestão da Qualidade
realizar seu trabalho, principalmente nos pontos principais, como estes citados
pelo artigo 18:
a - implementação e manutenção do sistema da qualidade;
b – a gestão documental e dos procedimentos operacionais
padrão;
c – o programa de auto inspeções e programas de
treinamento;
d – o recolhimento de produtos e as suas simulações, bem
como investigação das reclamações e gerenciamento dos produtos devolvidos;
e – a implementação de um sistema para controle de
mudanças e o gerenciamento das ações corretivas e preventivas para as não
conformidades identificadas;
f– a garantia dos requisitos legais de licença sanitária
e autorização de funcionamento dos integrantes da cadeia de distribuição de
medicamentos;
g – a qualificação e calibração de equipamentos e
instrumentos;
h – gerenciamento de resíduos e adoção de um programa de
manejo de pragas;
j - comunicações aos órgãos sanitários, aos parceiros
comerciais e autoridades policiais competentes quando do roubo e/ou identificação
de produtos falsificados ou adulterados; e
k – a garantia da destinação adequada dos produtos identificados
como falsificados.
Equipe de qualidade do Sistema de
Gestão da Qualidade pressupõe profissionais com um bom grau de conhecimento,
amplitude de atuação e certa autonomia. A equipe da Gestão da Qualidade deve
ser respeitada internamente e não deve estar vinculada unicamente a interesses
comerciais. Há que haver um balanceamento entre as duas questões.
Documentação
Com relação aos procedimentos, o
tratamento é o mesmo já verificado na indústria farmacêutica, onde o sistema da
qualidade deve orientar a elaboração, aprovação, distribuição e controle,
treinamento, atualização, guarda dos documentos, que podem ser no formato físico
ou eletrônico, correspondendo à realidade das operações, serem seguidos por
todos e estarem disponíveis ao pessoal da operação. POP não pode ser de
enfeite, mas funcionalmente efetivo e de linguagem simples e direta. Devem
refletir as operações realizadas efetivamente.
Os registros em geral devem ser
claros e íntegros e devem ser guardados sem possibilidades de deterioração, com
um backup de segurança.
Reclamações
Investigar todas as reclamações
relacionadas com a qualidade, autenticidade, legalidade ou integridade dos
medicamentos ou aquelas relacionadas a eventos adversos é uma obrigação. Porém,
a responsabilidade é proporcional à participação de cada ente da cadeia que der
causa ao desvio. A investigação pela Gestão da Qualidade deve ser conduzida por
pessoal experiente e conhecedor do processo, de maneira a saber definir claramente
a causa raiz do problema e avaliar os impactos aos clientes. A Gestão da
Qualidade deve monitorar as situações onde possíveis reincidências de não
conformidade representem risco ao paciente.
É importante notar que o distribuidor
não tem responsabilidade exclusiva pelas reclamações relacionadas aos desvios
de qualidade; estas devem ser repassadas ao detentor do registro para
investigação, e os resultados desta devem ser incorporados ao seu relatório.
Recolhimento
Os distribuidores e armazenadores devem entender que quanto mais rápido e eficiente é o recolhimento, menos risco ao paciente e consumidores haverá. O detentor do registro é quem coordena a ação do recolhimento, porém, a participação dos demais elos da cadeia é proporcional à sua contribuição na distribuição, assim como à causa raiz do recolhimento.
Para que o recolhimento seja
eficaz, a empresa tem que ter registros detalhados da distribuição, os quais devem
ser facilmente recuperáveis ao tempo da validade dos medicamentos.
Deve ser realizada simulação de
reconciliação entre as unidades distribuídas e localizadas nos clientes, uma
vez ao ano para o pior caso da rede de distribuição, com o intuito de testar a
efetividade do recolhimento e corrigir possíveis falhas. Para isso, a precisão
dos registros dos números de lote e destino é fundamental para a eficácia do
processo. Entendo que uma simulação com produto tem maior chance de apontar as
falhas e possibilitar corrigir o processo.
Outro ponto de destaque é que o detentor
do registro sempre deverá ser consultado sobre o recolhimento quando outro ente
da cadeia de distribuição for realizá-lo, por que ele não é o dono do produto;
sua responsabilidade é compartilhada. Todo o processo de recolhimento deve ser
registrado em relatório informando o grau de recuperação das unidades
distribuídas.
A constatação da necessidade do
recolhimento deve ser informada a todos os clientes e as autoridades sanitárias
competentes, de todos os países a que determinado medicamento tenha sido
distribuído.
Devoluções
Medicamento devolvido somente
pode ser reintegrado ao estoque quando o sistema de gestão da qualidade avaliou
o motivo da devolução, as condições de armazenagem e de transporte empregadas.
Deve, também, avaliar a integridade da embalagem secundária original e o prazo
de validade. Do contrário ou havendo dúvidas, os medicamentos devem ser
rejeitados.
Os medicamentos objetos de furto,
roubo ou outras apropriações indevidas devem ser rejeitados, porém o parágrafo
primeiro do artigo 36 permite a reincorporação desde que não apresentem dano ou
violação da caixa de embarque e dispositivos de segurança. Ainda, devem estar
adequados, do ponto de vista da qualidade, segurança e eficácia por meio de uma
análise de risco executada sob a responsabilidade do distribuidor. Já os termolábeis,
em qualquer hipótese, devem ser destruídos.
Auto inspeções
As auto inspeções são uma
ferramenta preciosa para melhoria da qualidade dos produtos e processos, que devem
ter uma frequência estabelecida, realizadas por profissionais capacitados, não
vinculados ao departamento inspecionado. É uma oportunidade que a empresa tem
de rever seus processos e procedimentos e identificar falhas que podem
comprometer a qualidade dos produtos e serviços.
Qualificações e Validações
Assim como na indústria
farmacêutica, equipamentos e sistemas informatizados devem ser qualificados e
validados antes do seu uso ou após mudança crítica. O uso de ferramentas de análise
de risco pode dizer a necessidade de qualificação e validação dos equipamentos.
Bom, fico por aqui nesta curta
avaliação do Sistema de Gestão da Qualidade nesta resolução. Notem que existem
muitas semelhanças com as atividades desempenhadas em uma fábrica farmacêutica.
Portanto, o nível de profissionais desta área deve ser de grau compatível com a
exigência de qualidade e segurança para os pacientes e consumidores de
medicamentos.
Jair
Calixto
PharmAlliance Assessoria Ltda.
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